sábado, 26 de fevereiro de 2011

SABEDORIA NÃO SALOMÔNICA

Meu nome é Delfim. Estava em um ônibus na capital dois anos atrás e tive a felicidade de encontrar Deus. Soube que era o próprio, pois havia um deficiente físico no coletivo pedindo esmola, suas pernas não o sustentavam e por isso andava se rastejando no chão. O ônibus estava quase todo vazio, quando de repente o velho da penúltima cadeira tocou no homem que se levantou e andou. Não tive dúvidas, era Deus. O ônibus parou e o velho desceu, fui atrás dele que deixara cair sua carteira de idoso através da qual andava gratuitamente pelos ônibus do mundo, e lá estava o seu nome, apenas um nome onipotente sem sobrenome: Deus. Corri atrás dele, a multidão me atrapalhava, mas consegui chegar junto, chamei-o pelo nome, ele me olhou. Estendi meu braço com a carteira na mão, ele agradeceu com um sorriso que logo desapareceu, pois falei que queria pedir algo, seu semblante mudou para impaciência. “Mais um” deve ter pensado.

- Faz logo porque estou com pressa – Disse o todo poderoso.

Pensei na megasena, no futebol, em um emprego melhor, mas lembrei da bíblia e resolvi imitar o Salomão. Enquanto eu pensava em tudo isso, Deus tirava seus óculos de uma caixinha branca, colocou-os no rosto, e as lentes logo foram escurecendo naturalmente. De curiosidade perguntei admirado:

- Isso foi um milagre?

- Não, não. São apenas lentes “trasitions”.

- Ah bom – falei desapontado

- E então, o que você quer? Fale logo, daqui vou pro norte da África, aquele lugar está um caos.

Resolvi obedecer ao mestre e pedi rapidamente.

- Quero sabedoria senhor.

- Meu filho, os dias de hoje estão diferentes, não são mais como no tempo de Salomão.

- Mas é isso que eu quero, senhor, está decidido.

- Tudo bem, olhe na internet, hoje saiu o resultado do vestibular da USP e você está aprovado para cursar medicina. Parabéns!

Agradeci a Deus que sumiu no meio da multidão. Pulei de alegria.

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Comecei meu curso muito bem, tirava ótimas notas, mas a partir do segundo ano as coisas mudaram, descobri os prazeres da universidade. Comecei com uma cervejinha de leve, mas logo estava metido em orgias, depravações regadas a drogas e rock and roll.  Quando estava no meu quarto ano, um aluno experiente estava pra se formar e vendeu a “boca” pra mim, tomei conta de todo o tráfico de drogas da USP, fiquei rico, famoso, pegava todas as meninas, a sapiência que Deus me dera, estava dando certo. Até o dia em que a polícia federal bateu na porta da minha residência universitária. Dei-me conta que tinha tomado o caminho errado. Usei a sabedoria que Deus me dera para querer ser esperto e não um sábio de verdade.

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Hoje estou aqui preso por tráfico de entorpecentes, ainda faltam 7 anos para minha pena acabar, nem o curso de medicina deu tempo “trancar”, definitivamente perdi tudo.

Ontem na cadeia dois indivíduos brigavam por um celular que cada um achava ser o dono, tomei a frente da situação, me inspirei em Salomão e disse que resolveria:

- Parta o celular ao meio, cada um fica com metade.

Esperei alguém renunciar o celular para então entrega-lo ao dono, não foi o que aconteceu, fui chamado de estúpido (ou de um sinônimo bem mais chulo). Levei uma surra das grandes.

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Hoje me arrependo amargamente de não ter pedido ganhar na megasena, um emprego no Banco do Brasil ou, quem sabe, mais um título estadual para o Potiguar.

Moisés C. CouTo

2 comentários:

  1. Mais um título estadual para o Potiguar? Realmente, temos ter cuidado com o q pedimos..
    aiaiaia.

    ;**

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