terça-feira, 10 de janeiro de 2012

TRISTE FIM


Pela primeira vez na vida Policarpo sentiu aquela sensação horripilante. Acordou, mas não despertou. Depois de sair do estado de sono, não conseguia mover um músculo sequer, senão suas pálpebras, o que o manteve com os olhos arregalados, tentando entender o que acontecia. E assim, passou alguns minutos até que sua esposa percebeu a estranheza da situação, afinal, Policarpo costumava levantar cedo. Ao ver o marido de corpo teso e olhos esbugalhados, caiu nos prantos ao pé da cama. Aquilo só aumentou a aflição de Policarpo que não estava morto, mas nada podia fazer. Mal sabia ele que estava a sofrer de um raro distúrbio, a catalepsia (ou paralisia do sono) que implica em imobilidade passageira dos músculos. Sua esposa só teve forças para chamar os familiares e iniciar o funeral. E rapidamente Policarpo estava dentro de um caixão. Mentalmente ele gritava, mas nenhum sôfrego gemido saía de sua boca, ele não conseguia se mover e mesmo aflito, nenhuma lágrima molhava seu rosto. Tentava, sem êxito, provar que estava vivo e não morto. A cada parente e amigo que lhe olhava, Policarpo tentava demonstrar sua viveza, porém com fracasso. De repente, para aumentar ainda mais o desespero de Policarpo, uma cunhada apressada já marcara o enterro para dali à uma hora, e o vivo-morto agonizou tenebrosamente cada segundo daquele funesto. Já no cemitério, prestes a ser colocado na cova, sua esposa lhe beija a testa e Policarpo na última tentativa de evitar o pior grita mentalmente e tenta se mover com todas as suas forças. Sem sucesso! E então, ele é colocado na vala e coberto por areia úmida. Terminado o serviço dos coveiros, todos vão embora comentando da bondade de quem para eles acabara de morrer. Após o último parente fechar o pesado portão do cemitério, Policarpo até que enfim consegue se mover e despertar daquela tormentosa acinesia. E agora se ver preso dentro de um angustiante caixão. Grita, esperneia, esmurra, chora, mas o portão estava fechado e todos já foram embora. E novamente ninguém conseguiu perceber o sofrimento de Policarpo. E assim ele morreu, em um vagaroso, sufocante e agoniante padecimento. Triste fim de Policarpo, diria o outro.

Moisés Couto