Pela primeira vez na vida Policarpo
sentiu aquela sensação horripilante. Acordou,
mas não despertou. Depois de sair do estado de sono, não conseguia mover um
músculo sequer, senão suas pálpebras, o que o manteve com os olhos arregalados,
tentando entender o que acontecia. E assim, passou alguns minutos até que sua
esposa percebeu a estranheza da situação, afinal, Policarpo costumava levantar
cedo. Ao ver o marido de corpo teso e olhos esbugalhados, caiu nos prantos ao
pé da cama. Aquilo só aumentou a aflição de Policarpo que não estava morto, mas
nada podia fazer. Mal sabia ele que estava a sofrer de um raro distúrbio, a
catalepsia (ou paralisia do sono) que implica em imobilidade passageira dos músculos. Sua esposa só teve forças para chamar os familiares e iniciar o
funeral. E rapidamente Policarpo estava dentro de um caixão. Mentalmente ele
gritava, mas nenhum sôfrego gemido saía de sua boca, ele não conseguia se
mover e mesmo aflito, nenhuma lágrima molhava seu rosto. Tentava, sem êxito, provar que estava vivo e não morto. A cada parente e amigo que lhe
olhava, Policarpo tentava demonstrar sua viveza, porém com fracasso. De repente,
para aumentar ainda mais o desespero de Policarpo, uma cunhada apressada já
marcara o enterro para dali à uma hora, e o vivo-morto agonizou tenebrosamente
cada segundo daquele funesto. Já no cemitério, prestes a ser colocado na cova,
sua esposa lhe beija a testa e Policarpo na última tentativa de evitar o pior grita
mentalmente e tenta se mover com todas as suas forças. Sem sucesso! E então, ele é colocado
na vala e coberto por areia úmida. Terminado o serviço dos coveiros, todos
vão embora comentando da bondade de quem para eles acabara de morrer. Após o
último parente fechar o pesado portão do cemitério, Policarpo até que enfim consegue
se mover e despertar daquela tormentosa acinesia. E agora se ver preso dentro
de um angustiante caixão. Grita, esperneia, esmurra, chora, mas o portão estava
fechado e todos já foram embora. E novamente ninguém conseguiu perceber o
sofrimento de Policarpo. E assim ele morreu, em um vagaroso, sufocante e agoniante padecimento. Triste fim de Policarpo, diria o outro.
Moisés Couto