terça-feira, 31 de maio de 2011

O CACHORRO E A MACONHA

- Filho vem cá. Precisamos conversar.

- Sobre o quê?

- Sobre isso.

O pai abre a mão e mostra cinco gramas de maconha amassada já molhada do suor que  transpirara pela palma da mão de nervoso quando viu aquilo dentro do guarda-roupa do filho.

- O que é isso, pai?

- Você sabe muito bem o que é isso, seu maconheiro!

- Isso não é meu, pai!

- Se não é seu, é de quem? Só moramos eu e você nessa casa, isso estava dentro do seu guarda-roupa, só pode ser seu.

- É do cachorro, pai.

- QUÊ?! Quer me fazer de otário, moleque?

- É verdade, pai. O Ralf fuma maconha.

- Você enlouqueceu de vez?

- Estou falando sério!

- Você precisa é de uma lição seu filho da p...

O cachorro adentra a sala da casa com um cigarro de maconha aceso na boca. O pai estupefato, só tem palavras para pedir desculpas ao filho. Depois de alguns minutos de silêncio, ele fala:

- A televisão precisa saber disso.

- Ninguém iria acreditar.


.

O pai vai para a cozinha, abre um whisky e tenta acreditar no que acabara de ver. O jovem, aproveitando que está sozinho com o cachorro na sala, retira o cigarro da boca do  animal desamarrando um cordão que ficara escondido debaixo das orelhas de Ralf, desfigurando toda aquela situação inimaginável que ele criara para se livrar do flagrante. Com o pai ainda absorto com a estória, o jovem vai para o quarto e aproveita para usufruir da grande quantidade de maconha que tem e acende vários baseados seguidos. Duas horas e meia depois de muita alucinação, Ralf entra no seu quarto. O jovem, de olhos vermelhos, ri e resolve dá um afago de agradecimento ao bicho de estimação. Mas o cachorro o evita, olha nos seus olhos e fala:

- Vou contar tudo pro seu pai!

O jovem ficou atônito e o efeito da droga passou rapidamente.


.

Depois daquele dia o jovem só pensava na promessa que o cachorro garantiu cumprir, olhava para o cachorro com receio, evitava seus olhos, sempre tentava estar por perto quando o pai estava sozinho com o cão, queria saber se realmente Ralf iria contar algo. O cachorro passava perto do jovem, parecia querer intimidar, e ele fazia de tudo para que o cão não se estressasse, colocava refeições fartas, passeio diário e fêmeas no cio sempre que Ralf começava a confundir perna com cadela. Chegou a oferecer sua cama para o animal dormir. Depois de tudo isso, o jovem nunca mais fumou e o cachorro nunca mais falou.

Moisés CouTo


segunda-feira, 2 de maio de 2011

TRONO

Meu nome é Dom Jaime III. O lugar que mais gosto é onde estou agora, meu trono! Só aqui sinto quem, verdadeiramente, sou: um rei. É desse trono que mando aumentar a colheita dos meus campos, diminuir a pesca de lagosta dos meus lagos para que elas possam se reproduzir. É do meu trono que mando vir os pretendentes da minha linda filha princesa. É daqui do meu trono que absolvo os que merecem e condeno os malfeitores que insistem em promover a desordem de meu reino. Henrique, ex Dom Henrique, sofreu em minhas mãos, além de ser enforcado foi apedrejado em praça pública, quem mandou desobedecer minhas ordens? Só no meu trono consigo sentir a realeza na qual gozo minha vida. Deleitosa sensação de alívio quando do meu trono vejo todo o meu reino funcionar sincronizadamente. Meu manto é tão leve que me dá a sensação de estar nu. Sublime sensação de conforto que só meu trono oferece. Porém, infelizmente chegou a hora. A hora que me levanto, dou descarga, saio, e toda a minha fantasia real vai embora junto com meus excrementos, água abaixo, como se eu não precisasse dela. Fora de meu trono sou apenas Jaime, e trabalho em uma multinacional...

- Jaime!

- Oi, senhor!

- O que você está escrevendo ai?

- Nada, são apenas reflexões que acabei de...

- Você não acha pouco ficar meia-hora no banheiro e depois não trabalhar porque está escrevendo reflexões?!

- É porque são para o meu livro, se não escrever agora acabo esquecendo.

- Você está maluco? Isso aqui é uma empresa e não um antro de vagabundagem!

- Sim, senhor!

- Deixe-me ler um pouco disso ai.

- Melhor não, senhor. Não vai querer perder seu tempo com bobagens.

- Ainda estou desfrutando dos meus três minutos de pausa para o café. Ainda há tempo.

- Não vai gostar de ler, são apenas imaginações surreais.

- Então trate de parar com imaginações imbecis e volte ao trabalho, Jaime!

- Sim, senhor Henrique.
Moisés CouTo